O Projeto de Lei 1087/2024, que promete isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$5.000, tem dominado o noticiário. Mas será que essa medida é de fato justa — ou apenas uma estratégia populista em ano pré-eleitoral? Neste artigo, o Dr. Fernando Ferreira, advogado especialista em Direito Bancário, Mercado de Capitais e Tributário do Rodrigues Ferreira Advogados (RFADVS), explica o que muda, quem realmente será impactado e quais são os efeitos econômicos ocultos dessa mudança.
O que o PL 1087/2024 propõe
O projeto altera a legislação do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) com dois objetivos declarados:
- Isentar totalmente quem ganha até R$5.000 por mês;
- Reduzir parcialmente o imposto para quem ganha entre R$5.000 e R$7.000 mensais;
- Criar uma tributação mínima para altas rendas (acima de R$50.000/mês).
“Quem ganha até cinco mil reais, a regra é pagar zero. Mas quem ganha entre cinco e sete mil verá apenas uma redução simbólica.”
Em tese, a proposta parece equilibrada — mas na prática, segundo o Dr. Fernando, o benefício real é pequeno. Simulações mostram que um contribuinte com renda de R$7.000 teria um ganho de apenas R$46 por mês. Já quem ganha R$5.000 veria um “alívio” de cerca de R$312 mensais — valor que cobre, no máximo, uma conta de luz familiar.
Por que a medida é considerada populista
Embora a intenção de aliviar o bolso do trabalhador seja válida, o projeto é visto como uma manobra política em ano pré-eleitoral (2026). Ele oferece um ganho simbólico imediato ao contribuinte, mas não resolve o desequilíbrio estrutural da tributação no Brasil.
“O governo não é bobo — ninguém dá algo de graça. Essa isenção tem custo, e alguém vai pagar essa conta.”
Segundo o DIEESE, o salário mínimo necessário para custear as necessidades básicas de uma família deveria ser de R$7.600 — quase o dobro do salário real vigente. Ou seja, a faixa de isenção até R$5.000 não acompanha o custo de vida real do brasileiro.
O impacto para a classe média e o risco da falsa sensação de ganho
O maior problema do PL é que ele não resolve o peso tributário da classe média, que continua sendo o grupo mais pressionado. Servidores, profissionais liberais e pequenos empresários terão impacto nulo na renda líquida, enquanto o custo de vida tende a aumentar com a reforma tributária em curso.
- Até R$5.000: isenção total (ganho real pequeno);
- De R$5.001 a R$7.000: redução simbólica (até R$46);
- Acima de R$7.350: nenhum ganho efetivo.
“Para quem ganha acima de R$7.350, o ganho é zero. E a classe média continua arcando com a maior carga tributária do país.”
O novo imposto para altas rendas
O PL também institui uma alíquota adicional para quem ganha acima de R$50.000 mensais (equivalente a R$600 mil por ano). A justificativa seria “corrigir desigualdades”. Contudo, segundo o Dr. Fernando Ferreira, a medida viola o princípio da isonomia tributária previsto na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional.
O princípio da igualdade determina que todos são iguais perante a lei, e que a tributação deve observar critérios de capacidade contributiva e razoabilidade. Quando o Estado tributa “a mais” um grupo específico, abre-se margem para questionamentos judiciais.
“Não é porque alguém ganha mais que deve ser punido com tributação excessiva. Isso fere o equilíbrio econômico e desestimula investimento.”
Relação com a reforma tributária e o efeito dominó
O PL 1087/2024 não pode ser analisado isoladamente. Ele caminha junto à reforma tributária, que tende a aumentar o custo das empresas e, consequentemente, dos bens e serviços. O resultado previsível é que o benefício nominal da isenção será consumido pela inflação e pela elevação de preços.
- Mais impostos sobre consumo → preços sobem;
- Maior custo para empresas → repasse ao consumidor;
- Menor investimento produtivo → redução de empregos e renda.
“A isenção de R$300 vai se perder quando o pão, a conta de energia e o transporte subirem. No fim, o contribuinte continua pagando a conta.”
Aspectos jurídicos e econômicos em debate
O PL fere dois pilares fundamentais do sistema tributário brasileiro:
- Princípio da igualdade (CF/88, art. 5º) — Todos são iguais perante a lei, sem distinção arbitrária;
- Princípio da capacidade contributiva (CTN, art. 145, §1º) — Tributos devem ser proporcionais à real capacidade de pagamento, sem distorções políticas.
Além disso, há o risco de judicialização massiva quando a “tributação mínima” de altas rendas entrar em vigor, dada a provável inconstitucionalidade da diferenciação criada.
Conclusão: o que realmente está em jogo
A promessa de “isenção até R$5.000” é, na prática, um alívio ilusório. O ganho mensal médio de R$300 não compensa o aumento geral de preços e o peso da tributação indireta (consumo, energia, transporte, etc.). Enquanto isso, o Brasil segue com uma das cargas tributárias mais elevadas do mundo, sem contrapartida proporcional em serviços públicos.
“Essa não é uma vitória do contribuinte — é uma jogada de marketing fiscal. A verdadeira reforma tributária ainda está por vir.”
Sobre o Dr. Fernando Ferreira
Advogado especialista em direito bancário, mercado de capitais e tributário, sócio do Rodrigues Ferreira Advogados (RFADVS). Atua na defesa de contribuintes e empresas em matérias fiscais e financeiras, com foco em estratégias preventivas e correção de distorções tributárias.
